Para entendermos uma lei, é necessário analisar além da sua letra, o contexto histórico na qual foi produzida. Este último, de importância ímpar para entendermos o que motivou sua criação. A Lei de imprensa, por exemplo, surgiu em uma época que se buscava veementemente calar a voz do povo. Entendendo isso, foi editada uma norma que intimidava os “formadores de opinião”, pois, perspicazmente conclui-se que, um povo mal instruído é massa facilmente manipulável. Assim, o legislador encontrou na anulação dos meios de comunicação a maneira mais rápida e eficaz de atingir tal objetivo.
Finda ditadura e também a referida Lei; em plena sociedade democrática, eis que surge o debate acerca de outra norma engessadora. Desta vez tendo por alvo, não o profissional da comunicação, mas todo um Poder hierarquicamente análogo ao Legislativo; o Judiciário.
Não é difícil imaginar de quem seria a autoria de um projeto de Lei que tem por escopo levar a pó o princípio da tripartição de poderes. É de menor surpresa ainda, a conclusão sobre quais seriam os reais propósitos do ilustríssimo Deputado Paulo Maluf (PP  SP) ao propô-la.
É de fácil visualização a ansiedade com a qual este senhor deve aguardar a votação de uma norma que, segundo seus defensores, visa tão-somente proteger a honra, a dignidade e imagem de pessoas “apenas” acusadas, cujos processos ainda não transitaram em julgado. Nos perguntamos quais seriam os verdadeiros beneficiados com tal lei. A quem interessaria os longos processos recheados de recursos das mais variadas espécies? Imagine se todos eles estiverem sob segredo de justiça. Se nós, “povo”, que a cada biênio “renovamos” nossos representantes por meio voto, não tivermos ciência dos atos praticados por eles quando do seu mandato.
Esses defensores da Mordaça para o Judiciário usam como tese, a proteção aos Direitos Fundamentais do Homem, previstos no art. 5º, da nossa Lei Maior. Segundo os mesmos, a autoridade judiciária que expuser sua opinião ou manifestar qualquer pensamento acerca de processo no qual está atuando, deverá receber a condenação de autores de ações públicas e populares quando for reconhecida sua intenção de promoção pessoal, má-fé ou perseguição política, penalizando os responsáveis pela ação com multa equivalente a dez vezes o valor dos custos processuais gastos pelos acusados, além de prever condenação de até 10 meses de prisão aos autores.
Para os que conseguem enxergar mais além e lutam contra tal lei, trata-se de arbitrariedade. Uma busca desenfreada pelo silêncio dos aplicadores e fiscais da Lei. Para estes, trata-se de um retrocesso. É propor algo que já existe. Ao editar tal norma de proteção à honra, à dignidade e à imagem das pessoas, os legisladores fingem esquecer que os instrumentos para efetivação desses direitos já pousam no nosso ordenamento tão inflado.
Há muito que o poder conferido ao Ministério Público incomoda alguns dos nossos representantes, os quais até pouco gozavam de um sigilo de justiça quase absoluto quando das suas práticas delituosas, hoje tão perseguidas.
Em entrevista ao Estadão, em 17 de junho, o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, José Carlos Cosenzo, afirmou que o projeto seria uma represália do ex-prefeito de São Paulo motivada pelos processos criminais e civis nos quais ele já foi réu. "Ele (Paulo Maluf) usa o mandato para retaliar o MP. O projeto prejudica a sociedade, pois cerceia a ação daquele que quer acabar com a impunidade", disse.
Parece que, na atual conjuntura são outros os Direitos Fundamentais que precisam ser resguardados: manifestação do pensamento e a liberdade de consciência. Esses, sim, necessitam cada vez mais da guarida, precipuamente daqueles representantes que, infelizmente ainda legislam em causa própria.
Lívia Maria Dantas de Carvalho


Loading




Subscribe to Acadêmica de Direito by Email