A INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E O RESPEITO À NORMA LEGAL


O juiz, ao interpretar a lei, não pode ater-se a simpatia ou ojeriza às partes no que tange a suas classe social, nacionalidade, profissão, idéias políticas e religiosas. Deve, acima de tudo, procurar interpretar o direito sempre de forma objetiva, equilibrada, desapaixonante, respeitando a razão e, as vezes usando de audácia.
O interprete deve manter o raciocínio longe da paixão, pois ela é cega. Deve, sempre, procurar interpretar e aplicar a lei ao caso concreto de forma a objetivar o bem comum, mas nunca, para isso, extrapolar o limite da própria norma jurídica.
“Cumpre evitar, não só o demasiado apego à letra dos dispositivos, como também o excesso contrário, o de forçar a exegese e deste modo encaixar na regra escrita, graças à fantasias do hermeneuta, as teses pelas quais este se apaixonou, da sorte que vislumbra no texto idéias apenas existentes no próprio cérebro, ou no sentir individual, desvairado por ojerizas e pendores, entusiasmos e preconceitos.” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 103.)

Em acórdão do qual foi relator o eminente Ministro Oscar Corrêa, o Supremo Tribunal Federal já decidiu:
“Não pode o juiz, sob alegação de que a aplicação do texto da lei à hipótese não se harmoniza com o seu sentimento de justiça ou equidade, substituir-se ao legislador para formular de próprio a regra de direito aplicável.
Mitigue o Juiz o rigor da lei, aplique-a com equidade e equanimidade, mas não a substitua pelo seu critério”. (Revista Brasileira de Direito Processual. Ed. Forense, Vol. 50, p.159).
“Em geral a função do juiz, quanto aos textos, é dilatar, completar e compreender, porém não alterar, corrigir, substituir. Pode melhorar o dispositivo, graças a interpretação larga e hábil; porém não – negar a lei, decidir o contrário do que a mesma estabelece. A Jurisprudência desenvolve e aperfeiçoa o Direito, porém como que inconscientemente, com o intuito de o compreender e bem aplicar. Não cria, reconhece o que existe, não formula, descobre e revela o preceito em vigor e adaptável à espécie. Examina o Código, perquirindo das ciências sociais, interpreta a regra com a preocupação de fazer prevalecer a justiça ideal (richtiges Recht), porém tudo procura achar e resolver com a lei, jamais com a intenção descoberta de agir por conta própria, proeter ou contra legem.” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Forense, 1994, p.80)
Carlos Maximiliano, citando C.A Reuterskioeld – Ueber Rechtsauslegung, 1889, p.66, esbraveja lição que deve ficar integrada ao consciente do intérprete:
“Esteja vigilante o magistrado, a fim de não sobrepor, sem o perceber, de boa fé, o seu parecer pessoal à consciência jurídica da coletividade; inspire-se no amor e zelo pela justiça, e “soerga o espírito até uma atmosfera serena onde não ofusquem as nuvens das paixões.” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Forense, 1994, p.105).
Pode-se concluir que a norma escrita nem sempre é justa, a não ser nos casos onde as diferenças entre a lei e o fato são praticamente insignificantes. No entanto, abandonar o ordenamento jurídico, sob o pretexto de alcançar o ideal de justiça, somente levaria a um mal maior. Isso porque a vantagem precípua das condições consiste na certeza e na estabilidade do Direito, pois afinal “la vida de la comunidad humana exige uma regularidad o, más bien dicho, uma regulación que la haja posible, ordenada, perfectible, justa. Esto costituye el motor y el fin Del derecho y es de uma significación viva y permanente. (El hombre es um animal jurídico.).” GARAY, Luis de. Que es el derecho? México: Editorial Jus, 1976.



CONCLUSÃO


Sendo a existência do ordenamento jurídico uma constante em toda sociedade, deverá, sempre e necessariamente, sujeitar-se a regras de interpretação jurídica visando a conferir a aplicabilidade da norma legal às relações sociais que lhe deram origem, estender o sentido da norma às relações novas, inéditas ao tempo de sua criação, e temperar o alcance do preceito normativo, para fazê-lo corresponder às necessidades reais e atuais de caráter social.
Interpretar é explicar, esclarecer. Dar o significado de vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão, extrair, de frase, sentença ou norma, tudo o que na mesma se contém.  (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Forense, 1994, p.09).
Tais finalidades perseguidas na interpretação jurídica precisam ser essencialmente cumpridas, objetivando o acompanhamento evolucionário de ordenamento jurídico com o desenvolvimento cultural, de modo a afeiçoá-lo às exigências e necessidades sociais.
Os avanços na medicina como evolução de engenharia genética, as experiências no campo da fecundidade, a reprodução humana assistida, a chamada barriga de “aluguel” e o banco de sêmen, são, induvidosamente, novidades que trarão reflexos no âmbito do Direito. (SEBASTIÃO. Jurandir. Responsabilidade Médica Civil Criminal e Ética. Belo Horizonte: 1998, Del Rey.)
A união homossexual que, atualmente, não constitui novidade, e sim, uma realidade em todo mundo. Comprova-se tal alegação pelo exemplo adotado na França que, recentemente, legalizou a união homossexual – Pacs -, criando, assim, algumas vantagens para os companheiros homossexuais.  
Nota-se também o agravamento de problemas tais como a pobreza e a fome generalizadas, o aumento da mortalidade infantil e o crescimento exacerbado da violência urbana.
Todas essas inovações e problemas sociais estão, sem dúvida alguma, umbilicalmente ligados ao Direito. Deve procurar o intérprete não ficar adstrito à letra morta e fria da lei. Há de buscar sugar conhecimentos diversos ligados não só à ciência jurídica, como os relacionados às mudanças sociais, tecnológicas e políticas, enfim, todo o conhecimento inerente à realização do árduo ofício d juiz: a busca da justiça.
É bem verdade que “não existe nada indolor na interpretação e aplicação do direito.”
Autoria: Isabella Rodrigues