Íntegra do julgado do TJRS
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. habeas corpus de ofício. TRANCAMENTO DO PROCESSO PENAL. Sogro que oferece dinheiro para manter relação sexual com sua nora. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO.

1. No caso concreto, o réu foi acusado por sua nora, de lhe ter oferecido R$ 160,00 para que mantivessem uma relação sexual por semana. Notitia criminis feita pela vítima e por seu marido, filho do imputado. Situação enunciada no início de 2008; portanto, há mais de dois anos, reveladora da desnecessidade de intervenção do aparato criminal, ainda preocupado em definir a competência para apreciar a matéria, de uma infração já prescrita.



2. Em face da imputação de possível contravenção penal de molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável (art. 65 do Decreto-Lei n. 6.259, de 10.2.1944), da pena cominada ao tipo contravencional e do tempo transcorrido, é de ser decreta a extinção da punibilidade pela prescrição, restando prejudicado o conflito de competência.

PRESCRIÇÃO DECLARADA.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA PREJUDICADO.

Conflito de Jurisdição - Sexta Câmara Criminal
Nº 70035042225 - Comarca de Santa Maria
PRETOR DA VARA DO JECRIM DA COM DE SANTA MARIA -  SUSCITANTE
JUIZ(A) DE DIR DA 4 VARA CRIM DA COM DE SANTA MARIA -  SUSCITADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar extinta a punibilidade do réu E.R.D. pela pena in abstrato cominada ao artigo 65 da Lei das Contravenções Penais, prejudicado o conflito de competência.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (Presidente) e Des. Mario Rocha Lopes Filho.

Porto Alegre, 08 de abril de 2010.

DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI,
Relator.

RELATÓRIO

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

Trata-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo Juízo da Vara do Juizado Especial Criminal da Comarca de Santa Maria, em relação ao Juízo da 4ª Vara Criminal da mesma Comarca (fls. 26 e 27).

O suscitante entendeu não ser competente para julgar, pois a questão envolve crimes praticados com violência doméstica e familiar, sendo, assim, competente o Juízo da 4ª Vara Criminal.

Neste grau, o representante do Ministério Público opinou pela procedência do conflito negativo de competência, para ver declarado competente o Juízo da 4ª Vara Criminal de Santa Maria (fls. 41 e 42).

É o relatório.

VOTOS

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

Eminentes colegas:

Inicialmente, importante considerar ter sido a notitia criminis dada em 22.01.2008, há mais de dois anos. Naquele dia, na Delegacia de polícia da cidade de Santa Maria (também conhecida por Santa Maria da Boca do Monte) compareceram L.S.A.D. dizendo ter sido “assediada sexualmente” por seu sogro E.R.D, com 67 anos de idade, quem vive com a esposa e outro filho. A vítima, com 19 anos no dia do registro da ocorrência, estava acompanhada de seu marido E.M.D, com 33 anos.

Segundo a vítima, estava sozinha em casa, quando seu sogro entrou no pátio e, da janela, começou a conversar, até que lhe ofereceu R$ 160,00 para que mantivessem uma relação sexual por semana, sob a condição de nada contar para o marido, seu filho. O sexagenário saiu, mas ao vê-lo retornar, a vítima telefonou para seu marido, quem estava trabalhando. Com o retorno deste, foram até a Delegacia de Polícia registrar a ocorrência.

Na Delegacia de Polícia, ao ser ouvido, o filho confirmou o telefonema e a proposta (dito por sua esposa). Também referiu que seu genitor já havia feito isso com outras pessoas, mas que, ao fazer isso com a própria nora, “está demais”.

O acusado de assediar a nora, ao ser escutado na Delegacia de Polícia, negou ser tarado. Disse: “que o declarante não é tarado...” Admitiu ter estado na casa de sua nora, mas para cobrar uma conta, ocasião em que um menino de 13 anos abriu a porta. Nisso, viu sua nora sair correndo para o banheiro, “somente de camisola e com as calcinhas na mão”. Importante: “o menino estava com o pênis ereto, para fora da roupa”.
Diante de tudo isso, resolveu entrar na casa e tomar chimarrão com sua nora, quem lhe disse não ter dinheiro para pagar a dívida. Depois de tomar umas três cuias de chimarrão, saiu para sua caminhada diária. Nesse dia, seu filho estava viajando.

Em outra oportunidade em que foi cobrar sua nora, entrou pelos fundos e, em face do que já havia presenciado (o menino com o pênis ereto e sua nora correndo para o banheiro, com as calcinhas na mão), resolveu “atirar verde para colher maduro”. Então, lhe ofereceu uma Brasília 1976, para dar uma “gozadinha”. Depois disse que tinha um dinheiro, compraria um terreno e o colocaria em seu nome.

Segundo o sogro, fez tudo isso para “ver a sua reação”, sem que tivesse intenção de manter relações sexuais com sua nora. Nessa ocasião, inclusive, sua nora questionou acerca de como ficaria seu casamento, no que respondeu para continuar casada com seu filho e manter todo em segredo. Sua nora silenciou e ficou esperando que entrasse na casa.

Porém, como resolveu não entrar na casa, sua nora mandou-o embora, alegando que seu filho não queria que entrasse nem no pátio.

Em seguida, o sogro passa a dizer que, quando estava em casa, chegou seu filho, gritando que iria castrá-lo, cortar seu escroto.

Ainda, em seu depoimento, o acusado chega a dizer que, em uma das oportunidades em que foi até a casa de sua nora para cobrar a dívida, esta lhe atirou beijinhos, tendo retribuído.

Somente em setembro de 2009 é que o expediente policial foi enviado para o Fórum.

Após, houve manifestação do Ministério Público, pela aplicação da Lei Maria da Penha.

A seguir, o magistrado determinou o retorno do expediente ao Juizado Especial Criminal, em decisão de mais de três laudas.

Depois, novo parecer do Ministério Público, pela aplicação da Lei Maria da Penha.

Ainda, seguindo o tramite da engrenagem burocrática legal, o magistrado do Juizado Especial Criminal, por entender também não ser o competente para apreciar a matéria, suscitou o conflito e o processo viajou para a Capital do Estado, para decisão. Na Turma Recursal Criminal, a decisão foi de que, quem deveria apreciar a dúvida de competência, seria o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (naquela instância, houve parecer do Ministério Público em três laudas e acórdão em quase quatro laudas, da Turma Recursal Criminal).

Pois, até aqui chegou. E veio a este relator, já com outro e novo parecer do Ministério Público, atuante, agora, junto ao Tribunal de Justiça, com outras quatro laudas.

Acredito que chega.

Talvez o silêncio seja a melhor resposta.

Para isso não se destina o aparato criminal do Estado, a pesada, custosa e abarrotada de processos cíveis e criminais de extrema gravidade (estupros, tráfico de entorpecente, homicídios, roubos com morte....). Não vejo a seriedade necessária e merecida para intervenção do Estado, através de seu braço criminal, depois de passados mais de dois anos desse fato, se é que existiu. Já ocorreu a extinção da punibilidade pela prescrição.

Em tese, a narrativa é de uma contravenção penal de perturbação da tranquilidade, prevista no artigo 65 do Decreto-Lei n. 6.259, de 10.2.1944, o qual tipifica o fato de “molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável”, com pena de prisão simples de quinze dias a dois meses, mais multa.

O fato teria sido praticado em 22 de janeiro de 2008.

Até o momento, não incidiu nenhuma causa interruptiva da prescrição, a qual, segundo artigo 109, VI, do Código Penal, ocorreu em dois anos, os quais já transcorreram.

Portanto, voto pela extinção da punibilidade do acusado, pela prescrição, restando prejudicado o presente conflito de competência.

Des. Mario Rocha Lopes Filho - De acordo com o Relator.

Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (PRESIDENTE) - De acordo com o Relator.

DES. AYMORÉ ROQUE POTTES DE MELLO - Presidente - Conflito de Jurisdição nº 70035042225, Comarca de Santa Maria:

"À UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, JULGARAM EXTINTA A PUNIBILIDADE DO RÉU E.R.D. PELA PENA IN ABSTRATO COMINADA AO ART. 65, DA LCP, E JULGARAM PREJUDICADO O CONFLITO DE COMPETÊNCIA."