14. AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE

No Direito brasileiro o contrato por si só, não basta para a transferência do domínio que somente é adquirido pela tradição, no caso de coisa móvel e pelo registro de título no caso de coisa imóvel.

A - POR ACESSÃO

Legislação Básica – art. 1248 ao 1258, CC.
            Significa aumento da coisa objeto de propriedade. O termo tem também a noção de acessório.  Pelo princípio passa a pertencer ao dono da coisa o que se adere a ela, ou seja, o acessório segue o principal.

           
I – Conceitos:

“Modo originário de adquirir a propriedade em virtude do qual fica pertencendo ao proprietário tudo quanto se une ou se incorpora ao seu bem” Clóvis Beviláqua (art. 1248, I a V, CC).
“Direito em razão do qual o proprietário de um bem passa a adquirir o domínio de tudo àquilo em que a ele adere” Marcello Caetano da Costa.
Pelo princípio, passa a pertencer ao dono da coisa principal o que a ela se adere, também ocorre acessão quando da própria coisa exsurge um acréscimo, como o fruto da árvore. O problema jurídico surge quando as duas porções pertencem a proprietários distintos. Há, portanto a necessidade que se distinga o acessório do principal.

II - Modalidade:

1Acessão Natural (de imóvel a imóvel), sem a participação do homem.
2Acessão Industrial ou artificial (de móvel a imóvel), com a participação do homem.
3Acessão Própria, quando os acréscimos se formam pelos depósitos ou aterros naturais nos terrenos marginais dos rios.
4Acessão Imprópria, quando tal acréscimo se forma em razão do afastamento das águas que descobrem parte do álveo.

III - Requisitos para acessão:

a)Conjunção entre duas coisas, até então separadas. Se as duas coisas continuam ter vida autônoma, não é acessão.

b)Caráter acessório de uma coisa em função de outra. A acedida é principal e a acedente e a acessória.

IV – Problemas Jurídicos que surgem:

a)Atribuição do domínio da coisa acedente à principal, resolvido pela regra de que o acessório segue o principal. Saber quem é o verdadeiro dono.

b)Conseqüências patrimoniais decorrentes da acessão, que será resolvido tendo em vista o princípio que veda o enriquecimento indevido, conferido ao desfalcado sempre que possível, uma indenização. No acréscimo, deve se indenizar quem perdeu.

V – Casos de Acessão

5Formação de Ilha, Art. 1249;
A formação de ilhas pela sedimentação paulatina ou pelo rebaixamento de águas no leito de rio não navegável dá origem à propriedade dos titulares das margens ribeirinhas na proporção de suas terras.

A Ilha na verdade não é caso de acessão, já que ela não é acrescentada ao solo. Se o Rio atravessa 02 ou mais Estados e é um rio navegável, se trata de um rio PÚBLICO, do contrário (se não for um rio navegável e passar por um só Estado), será um rio privado, no entanto, sua água pertence à União.
          
Para saber a quem pertence à ilha que surge no meio do rio é necessário que se trace uma linha imaginária no meio dele e posteriormente se delimite as propriedades que ficam à sua margem. No caso abaixo, a Ilha pertencerá quase em sua totalidade à “E”, sendo que, uma pequena porção, a “B”.




Art. 1.249, I e II, CC.

            Caso a ilha surja da formação de um braço, continuará a pertencer ao proprietário das terras que ficavam à sua margem.
O art. 24 do Código de águas estabelece que as ilhas ou ilhotas formadas pelos desdobramentos de um novo braço de corrente fluvial pertencem aos proprietários dos terrenos à custa dos quais se formaram. O parágrafo único deste artigo introduziu acréscimo importante a essa regra: “Se a corrente, porém, é navegável ou flutuável, elas poderão entrar para domínio público, mediante prévia indenização.”.

Tomando o exemplo abaixo, a ilha pertencerá a “B”.






                          
Art. 1249, III, CC.


6Aluvião, Art. 1252; (DUNAS)
“Os acréscimos formados por depósito e aterros naturais, ou pelo desvio das águas dos rios, ainda que estes sejam navegáveis, pertencem aos donos dos terrenos marginais”. (...) “Os acréscimos por aluvião, ou artificialmente, se produzirem na águas públicas ou dominicais, se não estiverem destinadas ao uso comum, ou se por algum título legítimo não forem do domínio particular”.
Deste modo, o dispositivo do CC aplica-se à aluvião em águas particulares. Esse acréscimo paulatino e imperceptível impede saber a quem pertencem as terras trazidas a outro local. Nisso se distingue da avulsão, em que ocorre um desgarra mento repentino e violento.
O acréscimo decorrente do fenômeno importa aquisição para o proprietário do imóvel. É o princípio que versa que “o acessório segue o principal”.
            Aluvião própria: decorre do acréscimo à porção de terras (dunas)
            Aluvião Imprópria: decorre do afastamento das águas.

OBS01: Se a água margeia estrada pública e não terreno privado, o acréscimo passa a ser público dominical (art. 17, p.u. código das Águas).
OBS02: Se a aluvião se formar diante de prédios pertencentes a proprietários diversos, pertencerá a eles em proporção à testada que possuíam na antiga margem.

7Avulsão, Art. 1.251, CC

“Existe quando a força súbita da corrente arranca parte considerável e reconhecível de um prédio, arrojando-a sobre outro prédio”.

Há um prazo decadencial de um ano para a ação de reivindicação ou indenização, no entanto se não for possível a remoção, restará a ação indenizatória.

Na hipótese da avulsão, a regra geral é diversa da aluvião. A porção de terra desgarrada continua a pertencer a seu proprietário até escoar-se o prazo de decadencial. Na avulsão, a porção desprendida é reconhecível, em razão de o seu desprendimento ser violento, o que não ocorre na aluvião. 

 Se há um morro e uma chuva ou vento forte desloca esse morro para a propriedade de “A” , este deverá indenizar o dono do morro, exceto se ninguém reclamar as terras por mais de um ano. Se o novo dono não quiser indenizar o velho, deverá devolver a terra.

Se por acaso o deslocamento do morro de A, destruir a plantação de B, aquele nada deverá a este, já que se trata de FORÇA MAIOR, exceto se o desmoronamento se deu por culpa de A (retirada de matas ciliares etc.).

8Álveo abandonado, 1252,

A regra é que p álveo abandonado (álveo derelictus), particular ou público, pertence aos proprietários ribeirinhos das duas margens, na proporção das testadas até o meio do álveo. Cuida-se de situação em que o curso de água seca ou se desvia.
Ocorrendo esse desvio de corrente de água, os proprietários das terras por onde as águas naturalmente abrem novo curso não têm direito à indenização. Trata-se de caso fortuito. Não é esta a solução se o desvio decorre de obra artificial, hipótese em que a perda do terreno será indenizada. Se a mudança da corrente ocorre por utilidade pública, o dono do prédio ocupado deve ser indenizado, passando o álveo abandonado a pertencer ao poder expropriante, como forma de compensação.
Se o rio voltar ao seu leito antigo, recompõe-se a situação anterior de propriedade dos prédios, salvo se essa retomada se der por utilidade pública (art. 26, p.u.), quando então a solução será a do artigo 27, a não ser que os proprietário.

9Construção e plantações, 1253.

Tecnicamente não se confundem construções e benfeitorias. Benfeitorias são obras ou despesas feitas na coisa para o fim de conservá-la, melhora-la ou embeleza-la. A construção, no entanto pode ser vista orça como acessão, ora como benfeitoria. Quem constrói em coisa acreditando ser sua, com o animus de dono ou de legítimo possuidor, faz benfeitoria. Na acessão, quem constrói sabe que o terreno não é seu, não une o fruto do seu trabalho à coisa que convictamente entende possuir ou ser dono.
O regime de construção ou de semeadura em terreno alheio pode ensejar o direito de retenção ao possuidor de boa fé, da mesma forma que as benfeitorias.
Regra geral é que o solo é o principal, no entanto nem sempre se procede desta maneira. No caso das construções de um bem imóvel, este será presumivelmente do dono do solo (art. 1.253, CC), todavia poderá ocorrer de forma diferente.
Se uma pessoa constrói no terreno de outra, independente de boa ou má fé, se o imóvel tiver valor consideravelmente superior ao solo, este passará a pertencer ao dono daquele, devendo para tanto indenizar o verdadeiro proprietário do terreno.
Hipóteses em que podem ocorrer semeadura, plantação e construção com sementes e materiais não pertencentes ao proprietário do solo:

1.A semeadura, a plantação ou a construção é feita em terreno próprio, com materiais alheios;

Essa hipótese é solucionada com o artigo 1.254, CC, onde expressamente afirma que “aquele que semeia; planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais alheios adquire sua propriedade, mas deve pagar o valor das coisas alheias utilizadas”.  Se estiver de má fé, alem da indenização devera pagar as perdas e danos.

2.A semeadura, plantação ou construção é feita em terreno alheio com materiais próprios;

               O semeador, plantador ou construtor em terreno alheio perde para o proprietário as coisas, com direito à indenização, se obrou com boa fé. Se esteve de má-fé, poderá ser constrangido a repor as coisas no estado anterior e a pagar pelos prejuízos (art. 1.255). Porem, se a construção ou plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento de indenização fixada judicialmente se não houver acordo.
                Se ambos estiverem de má-fé, o artigo 1.256, CC determina que o proprietário do imóvel adquira os acréscimos, devendo ressarcir o valor das acessões. Neste caso, ele terá direito de retenção, se detém o imóvel, pois aplica-se o princípio das benfeitorias. No entanto, o parágrafo único do art. 1.256 faz presumir a má-fé do proprietário do imóvel quando o trabalho de construção ou lavoura se fez em sua presença e sem impugnação sua.


3.A semeadura, plantação ou construção é feita em terreno alheio com materiais alheios.

Nesse caso, os materiais passam a pertencer inelutavelmente ao proprietário do solo. Se o semeador, plantador ou construtor estava de boa-fé, tem direito a receber o valor dos bens móveis. Nada deverá receber se estava de má-fé. Acrescenta o parágrafo único do artigo 1.257 que o proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a indenização, quando não puder receber do plantador ou construtor.
No caso das plantações, como dificilmente terá valor superior ao solo ou as sementes usadas indevidamente (no caso de plantar com as sementes de outro, ou usar seus equipamentos ou solo), deverá a pessoa que plantou de boa fé indenizar no valor das sementes. Se o fez de má fé, além das sementes deverá pagar também pelo lucro cessante. Ex: Se “A” comprou sementes para plantar e “B” agindo de má fé, usou as sementes de “A” também para plantar; praticamente toda sua colheita será de A, já que presume que se A tivesse plantado, estaria colhendo os mesmos frutos que B colheu usando suas sementes.

OBS: Quem invade com edificação um ou dois metros o imóvel vizinho, poderá ser mais conveniente a indenização do que o desfazimento parcial de obra que prejudique seu todo, bem como sua função social. Leva-se em conta que algumas edificações ganham maior valor que o solo. Vale ressaltar que durante a construção o proprietário invadido pode se valer da ação de nunciação de obra nova.

OBS2: Mesmo se houver má-fé, poderá não coincidir com o interesse social a destruição do prédio facultada ao proprietário. Ex: Construção de Escola ou hospital.

Observando a redação do art. 1.258, CC: “Se a construção, feita parcialmente em solo próprio não superior a vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte, e responde por invasão que a represente, também o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente”.
Parágrafo único: “Pagando em decuplo as perdas e danos previstos nesse artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção exceder consideravelmente o dessa parte e não puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção”.

A perícia informará ao Juiz sobre a proporção da referida vigésima parte e seu respectivo valor, bem como a conveniência da demolição que será sempre a última opção, principalmente quando esta afeta todo o construído.

A Lei estabelece uma multa vultosa para o invasor de má-fé, quando for conveniente que este mantenha sua parte invadida. Sempre deverá levar em conta se o valor da construção excede consideravelmente o valor do terreno, tomando por base a vigésima parte deste. De qualquer forma a punição com o décuplo do valor das perdas e danos ao possuidor de má-fé não poderá ser dispensada na decisão judicial. A matéria está mais afeta no direito de vizinhança.

Segundo Venosa, é necessário que haja pedido expresso para o réu adquirir a porção no imóvel, seja em reconvenção se o procedimento o permitir, seja em ação autônoma.
E se o invasor não tiver condições para suportar a indenização? Pode o deslinde de o pagamento ser deferido para uma problemática execução do julgado? O interessado poderia pedir uma caução para essa garantia. A solução, nessa circunstancia, apontaria inexoravelmente para a demolição.

Art. 1.259, CC: “Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde pelas perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos em dobro”.

No caso acima vemos que quando a invasão é de monta, fixando a lei em superior à vigésima parte do solo alheio, o possuidor de boa-fé é tratado aparentemente de forma mais benéfica, adquirindo o terreno invadido, mas pagando indenização na forma descrita. Essas verbas serão evidentemente objeto de perícia complexa, tendo em vista os tópicos descritos em Lei: valor da área invadida, valor da área perdida e desvalorização da área remanescente.

Quanto ao invasor de má-fé, a Lei determina que ele seja obrigado a demolir o que construiu em terreno alheio, pagando o dobro das perdas e danos. Pode ocorrer que a demolição seja mais prejudicial que a manutenção da construção. Note que este último artigo abrange a construção parcial superior à vigésima parte, ou total em terreno alheio. O art. 1.258 reporta-se unicamente à construção parcial em terreno alheio, a qual, como regra, ocorre em terreno contíguo ou do invasor.